quarta-feira, 23 de abril de 2014

- UM ANO de Canadá






No dia 23 de abril de 2013 cheguei no Canadá, quando comecei a escrever uma nova página na minha vida. Começando do zero, com a folha em branco.

E para ser bem sincera, não está sendo nem um pouco fácil. É um mundo de informações e descobertas sem fim. Todos os dias mais coisas para absorver. Hoje, digo que a principal característica para um imigrante sobreviver é a paciência, e isso que tem que ter de sobra. Ultimamente tenho me apegado ao conceito de "três anos de adaptação". Todos a minha volta dizem que este é o prazo para o imigrante se encaixar aqui no Canadá, principalmente para os adultos que tem todo o lado cultural, sistema econômico e político e regras sociais para se acostumar. Para uma cabeça já cheia de conteúdo, reaprender tudo novamente e num curto espaço de tempo é algo relativamente difícil e cansativo. 

No meu caso o que mais está me incomodando é o aprendizado do inglês que está muuuuuito mais lento do que eu imaginava que seria. Mas aos poucos estou me conformando que será assim. Óbvio que me comunico com as pessoas e não preciso mais do maridão para fazer as coisas, mas está extremamente longe do que preciso para me adaptar profissionalmente na minha área. E o pior (ou melhor), é que esta minha dificuldade tem explicação.... Mas isso é assunto para outro Post. Hoje, quero falar um pouco dos aspectos canadenses que tem feito parte da minha vida.

Para começar, eu aprendi que a diferença está nos detalhes. Porque para os problemas grandes, paramos para planejar como resolvê-los. O que desgasta as pessoas são as pequenas coisas do dia a dia, que na somatória deixam qualquer um louco. Lembro-me que no Brasil eu solucionava de uma maneira ou de outra todos os problemas que apareciam na minha vida. Mas no final do dia, o que me esgotava eram as pequenas chatices rotineiras, tipo o trânsito intenso; a discussão com o fornecedor de telefone; o sinal da TV a cabo que tinha caído; a conta do cartão de crédito que não havia chegado a tempo; a fila do banco quando tinha que ir fisicamente; as infinitas cobranças indevidas; a má educação da moça do caixa do supermercado; as obras públicas no meio do caminho sem indicação de desvio; o telefone celular que não parava de tocar quando tinha sinal, ou a falta de sinal do dito cujo; o planejamento da agenda de acordo com a hora das tempestades de verão para evitar enchentes (???); e assim por diante... Enfim, uma infinidade de micros questões que por alguma razão inexplicável sempre estavam acontecendo. Sabe a lei de Murphy? Não que ela não exista aqui no Canadá, ou que as coisas sejam sempre perfeitas, porque não são. Mas eu tinha a sensação de que no Brasil tudo era "sempre" do contra. Aqui as coisas fluem mais naturalmente, com menos irritações bobas.

Então, deixando o emocional de lado, vou tentar pontuar algumas coisinhas canadenses que fazem parte da minha rotina, sem nenhum tipo de ordem de prioridade ou importância:


Já falei bastante sobre o clima aqui na região de Vancouver, então tentarei ser breve para não ficar muito repetitiva. O que mais me atraiu foi o fato das estações do ano serem bem definidas e diferentes umas das outras. Não dá tempo de enjoar e sempre há aquela sensação de renovação. Para quem planeja visitar este cantinho do mundo, recomendo vir quatro vezes, pelo menos uma em cada estação, porque tanto o aspecto físico como as atividades são bem específicas e todas tem um lado positivo para se ver. Vale a pena conhecer as "quatro Vancouver" que existem!


Tenho que confessar que a comida tem sido um ponto negativo. Só agora dou valor para a fartura de alimento no Brasil. Aqui, além da falta de sabor (de tudo), o preço é algo absurdamente caro. O canadense (pelo menos aqui em Vancouver) tem mania da comida orgânica e da vida saudável, o que eu acho excelente. Mas para manter este hábito, tem que gastar muito. E nesta fase inicial de imigrante, não temos $$ sobrando para investir em tanto luxo. Carne vermelha é algo que já deixei para trás. Além de cara, não consegui me acostumar ao sabor. Ainda não achei nenhum açougue que me agradasse, apesar de ter tido várias indicações. Não foi por falta de tentativa. Portanto, carne vermelha só no hambúrguer (rsssss). Além dos altos preços, a falta de tempo também tem sido um complicador na nossa vida de imigrante, sem falar que não temos a maravilhosa secretaria doméstica brasileira para dar uma ajudinha. Aí a falta de tempo somada à preguiça, já viu né?! Cozinhar é coisa rara. Temos vivido à base de vitaminas de frutas (smoothies), sanduíches, pratos congelados, saladas, frutas frescas, omeletes e cereais. Umas duas vezes por semana me proponho a fazer comidinha. Mas só! E ainda reclamando (rssssss). Por outro lado, existe um prato típico canadense chamado "poutine" que me apaixonei. A Poutine é uma porção de batata frita coberta com um caldo a base de carne e ainda com uns pedaços de queijo meio derretidos. Muita gente não é fã deste prato, mas eu em particular adoro!!! Toda vez que tenho a oportunidade, como uma porção. Só não é algo freqüente pois é uma opção "relativamente" gorda!!! Com as novas condições de vida neste novo país, estamos criando novos hábitos para nos adaptar à nova rotina. Ou seja, tudo novo mesmo!!!



Outra coisa que é novidade é a mania do copo na mão. Aqui todo mundo está sempre andando com um enquanto se deslocam de um canto para outro. Isso é um hábito. Por causa do frio, é comum as pessoas se manterem aquecidas consumindo bebidas quentes enquanto estão ao livre. Aí o costume do inverno continua mesmo nos dias quentes durante o verão, substituindo o consumo os drinks gelados. O fato é que sempre estão bebendo alguma coisa. Então aquelas cenas de filmes americanos que estamos acostumados a ver do povo caminhando com um copo não mão, também faz parte do cenário daqui. No Brasil, eu tinha mania de garrafinha de água, pois tentava manter o hábito dos tais dois litros de água diários. Aqui, peguei a mania do café e do chá, ou seja, sempre com um copo na mão também.



Ah, o trânsito! Muuuuito fácil de lidar, principalmente para quem é paulista-paulistana. Sim, existe horário de pico com tráfego intenso, mas completamente diferente de São Paulo onde toda hora era "pico" em todas as ruas. No começo tive um pouco de dificuldade de me adaptar às regras locais, mas agora está fácil  Não só olhando pelo lado de motorista, mas também sendo pedestre. Aliás, pedestre aqui é levado a sério! E como todo mundo tem o momento de andar a pé, é natural respeitar as pessoas quando se é motorista. Mesmo porque, se não o fizer, vai ser parado pela polícia. Além disso, não existem "motoboys". No começo estranhei muito a facilidade de mudar de faixa, porque além da ausência das motos, as pessoas em geral dão passagem. Outra coisa que adoro aqui é o planejamento dos semáforos. É utilizada uma tecnologia nas principais vias que mede o fluxo de automóveis. Então, a sincronização dos sinais mudam de acordo com o movimento e circulação dos carros. Isso é algo nítido quando dirige em horários calmos como de madrugada, quando os semáforos abrem assim que se aproxima deles. É ótimo! Mas isso é algo que não tem em todo lugar, mas para a minha sorte tem na cidade em que eu moro, Coquitlam. 





Calçada é uma coisa que só conheci efetivamente aqui (kkkkkk). Às vezes os canadenses me perguntam o que eu mais gosto no Canadá, e eu como boa paulista respondo que são as calçadas. Óbvio que eles não entendem isso, mas nós brasileiros amamos as "sidewalks" canadenses (rssss). Brincadeiras à parte, qualquer lugar aqui é acessível aos pedestres, incluindo cadeirantes e cegos. E mesmo quando há uma obra que possa atrapalhar o percurso, é feito um tipo de desvio super sinalizado e pensado para garantir a circulação de pedestres. Outra coisa simples e positiva é que de maneira geral, é possível usar guarda-chuva enquanto anda pelas calçadas. Sei que mencionar isso até parece piada, mas era algo que eu sofria muuuuuuito no Brasil, pois ou passava o guarda-chuva, ou eu, ou em alguns casos, nenhum dos dois. Além disso tudo, a travessia das ruas também são ótimas. Sempre há um semáforo acessível ao pedestre que lhe permita pedir passagem. Todo e qualquer cruzamento ou faixa de segurança tem um poste com botão para o pedestre pedir a vez de atravessar. E acredite ou não, TODOS funcionam. Sim, pedestre tem vez aqui. Aliás, até mais que os automóveis. Sabendo-se disso, dá para imaginar como a vida de fazer as coisas sem carro é mais fácil por aqui. Sei que isso pode parecer loucura, mas eu em particular tive muitas experiências horríveis em São Paulo como pedestre, sobretudo porque eu trabalhava externa. Já escrevi sobre isso aqui no post "Pedestre paulistano: questão de vida ou morte".


Falar que o transporte público daqui é melhor que o do Brasil é redundante, pois qualquer país desenvolvido tem transporte público melhor que o brasileiro. Mas o transporte daqui da região onde moro é algo que na minha opinião deixa sim a desejar, principalmente considerando que estou no Canadá. Eu esperava mais deste item. No meu caso que moro fora do centro de Vancouver (estou nos arredores), sofro um pouco no uso do transporte público. Não que seja difícil usá-lo, pelo contrário, é muito fácil e em geral pontual. Mas o tempo de percurso é muito maior que o de carro, o que desanima só de pensar em pegar um ônibus. Por exemplo, para ir ao meu trabalho levo 1:10h usando transporte público (skytrain + ônibus). O mesmo trajeto de carro leva apenas 25min. Além disso, depois das 22h, algumas linhas de ônibus não funcionam mais. E as que permanecem em circulação, possuem um intervalo entre ônibus muito grande, aproximadamente 1 hora. Então isso é algo que acho que precisa ainda de muita melhora para condizer ao nível do país. As linhas do Skytrain (tipo metrô, mas a céu aberto) está sendo ampliada e logo logo chegará pertinho de mim. Mas este transporte está muuuuito longe de se igualar ao metrô de grandes capitais, sobretudo às européias como Paris e Londres. Aqui ainda é forte o hábito do carro, exceto para quem vive em Downtown onde o Skytrain é bem mais distribuído. Mas apesar da minha decepção, a qualidade dos veículos é boa e os ônibus têm suporte para Bike, o que é bem legal. Além disso, todos eles são acessíveis aos caldeirantes. E ainda como adicional, existe um sistema de Van específico para pessoas que tem alguma necessidade especial, chamado HandyDART, então, ponto positivo para este detalhe!



Para quem não sabe, bebidas alcoólicas são vendidas apenas em lojas específicas para isso, as chamadas Liquor Store. Estes estabelecimentos são super controlados pelo governo, que inclusive é proprietário de algumas delas. No meu caso, mesmo com mais de 30 anos, sempre tenho que apresentar meu documento para conferirem minha idade. Acho que ainda pareço adolescente (uhuuuuu). Nestes lugares, o cliente pode até entrar com cachorro ou gato, mas jamais com menor de idade. Nos supermercados tradicionais, vinho e cerveja apenas sem álcool. Recentemente até entrou em votação uma alteração sobre a legislação relacionada à venda destes produtos e algumas mudanças acontecerão ao longo do ano. Mas assim que tudo estiver definido, volto aqui para falar mais sobre isso. Por enquanto, compra de bebidas alcoólicas, apenas em Liquor Store. Ah! Prepare a carteira, pois este é outro item caríssimo por aqui, principalmente se comparar aos preços americanos.


Outro item que me pegou de surpresa foi a falta de burocracia. No Brasil eu tinha em casa um arquivo grande com documentos sem fim. Sério, em 5 anos de casada parecia que minha vida era uma empresa de tantos papéis. Eu tinha contas, comprovantes, cartas, comunicados, boletos, enfim, uma infinidade de papéis guardados e organizados entre pastas e datas. Tudo para "garantir" qualquer problema futuro. Aqui, depois de um ano, tenho uma pastinha sanfonada com apenas algumas folhas perdidas. Eles quase não usam documentos impressos. É tudo eletrônico. E não apenas na questão financeira, mas em todos os sentidos. Na minha escola por exemplo, quando me matriculei levei apenas meu ID. Nem comprovante de residência precisei pois o próprio ID já tem esta informação. Depois que conclui meu registro, FALARAM que eu deveria aparecer na primeira aula numa sala específica e em uma determinada data e hora. Não me deram nenhum papel. Nadinha. Sai de lá com minhas mãos abanando. Quando cheguei na sala de aula conforme as orientações passadas, o professor olhou para mim e disse "É um prazer Priscila tê-la em minhas aulas, meu nome é blá blá blá, escolha um assento". Acredita que a falta de papel funcionou? Quando pedi transferência de escola foi assim também. Falaram que bastava ir para tal endereço. Chegando lá, a mesma coisa. Todos já sabiam quem eu era, sem que eu falasse nada. No trabalho não foi diferente. No meu primeiro dia levei o ID e o SIN (tipo CPF). Só. Sai de lá com o meu contrato de uma página. Toda informação que eu quero a respeito do trabalho, pego no site da empresa online. Nem meus salários tem papel. Não assino nada. Não tem recibo para nada e nem um holerite físico. Recebo o $ na conta e pronto. Simples assim. Até hoje, depois de um ano, ainda tento guardar algum papel por uma questão de mania. Mas não tenho nada acumulado porque não tem o que acumular.


Como imigrante vim para cá esperando ser discriminada em algumas ocasiões. Eu imaginava que encontraria alguns obstáculos ou fosse mal tratada de vez em quando, afinal, eu não fazia parte deste mundo. Ao contrário disso, sinto-me extremamente bem recebida. Mesmo com as dificuldades da comunicação, não me sinto isolada do mundo. As pessoas em geral tentam me ajudar e fazem questão de que eu me sinta igual. Ignoram completamente as diferenças, sobretudo as culturais. Sim, este é o resultado do multiculturallismo canadense. E mais do que isso, é o sinal claro do respeito e do senso de comunidade. Todos estão no mesmo nível. Eles acreditam que todos são iguais independente de onde tenham nascido, de que língua falam, de qual crença tenham, ou como se vestem. As pessoas conversam entre si. Para nós que sempre estamos passeando com nossa cachorrinha percebemos isso claramente. Cachorro é motivo para iniciar conversa, então vira e mexe estamos batendo papo com gente estranha. Também sinto isso no trabalho e em qualquer lugar que eu vá. Esta sensação de "welcoming" é muito boa.


Isso é uma coisa canadense, inclusive motivo de piada para os americanos. Os canadenses são conhecidos pelo excesso de educação e cordialidade. É comum você ver uma pessoa local trombando com um objeto e pedir desculpa ao obstáculo inanimado, razão para até eles rirem de si mesmos. Para tudo existe o "por favor" e o "obrigado". São cenas corriqueiras você ver uma mãe conversando com o filho e lhe ensinando a usar estes tipos de expressões. Claro que existe a pessoa mal-humorada e a não tão educada, mas é raro. E quando algum canadense não é cordial, destaca-se entre as pessoas e é mal visto por todo mundo em volta. Também não é fácil ver algum canadense falando palavrões à toa. E quando querem dizer uma coisa deste tipo, tentam disfarçá-la usando alguma palavra parecida, por exemplo, ao invés de dizerem "shit" eles dizem "shoot". A cordialidade é um hábito nacional, é parte da cultura ser assim. E claro, para nós imigrantes, o mínimo é tentar imitar. Mesmo quando se quer falar um WTF com todas as letras!!! Nada disso. Segura a onda, põe a língua para dentro e aperte sorriso :)


Todo mundo fala mal do sistema de saúde canadense. Graças a Deus ainda não precisamos usá-lo muito. Mas já tivemos algumas experiências e, para nós está funcionando sim. Pagamos mensalmente o sistema público e até agora não precisamos usar nada particular. O Mauricio tem um ótimo plano de saúde privado oferecido pela empresa que complementa as necessidades, principalmente com descontos em medicamentos. Os prazos são as maiores reclamações. O marido teve sorte no caso dele relacionado ao problema no joelho consequente dos riscos do snowboard. Depois de uma queda enquanto saltava, ele rompeu vários ligamentos. Foi atendido por um bom médico e tudo tem caminhado de acordo com o que ele espera, inclusive já com cirurgia pré-agendada para o ano que vem. Mas esta data foi opção do Mauricio, que quer tentar aproveitar a próxima temporada de inverno antes da operação. O meu caso é um pouco diferente. Tenho problemas de enxaqueca crônica e minha médica de família já me encaminhou para um neurologista para que eu tenha acompanhamento profissional. Depois da recomendação dela, a consulta foi agendada para 6 meses à frente. Claro que achei isso um pouco demorado e estou aguardando a consulta que será em junho. Mas não foi nenhum caso emergencial para que possamos ter alguma reclamação. Até agora, temos convivido bem com esta questão. 


Se existe um tipo de pessoa que merece respeito, são os policiais daqui. São as pessoas mais graças do mundo e escreverei um posto só sobre isso porque acho que algo que se destaca. Mas de maneira geral, o que me admira é como eles tratam as pessoas. Aqui o condito de polícia é completamente diferente do Brasil. O trabalho deles é preventivo e não paliativo, o que significa que estão empenhados em educar a população para manter a ordem. Claro que quando algo está errado haverá repreensão e as atitudes cabíveis serão tomadas. Mas a primeira função da polícia é manter a ordem através da educação e orientação. Acho isso demais. As pessoas não tem medo dos policiais e há um conceito comunitário com este profissionais que só conheci aqui. Com o trabalho eficiente e presente da polícia, naturalmente há segurança. E aliado a estes profissionais, a igualdade social resulta na baixa violência. É claro que não estamos isentos de problemas relacionados à segurança, mas é uma questão de proporção. Os números são extremamente baixos, sobretudo se comparados ao Brasil. Todos sabem disso, mas sentir isso na pele é diferente. Até hoje eu e o marido desconfiamos um pouco do excesso de tranquilidade. Apesar de gostarmos da sensação de segurança, ainda estranhamos a falta de muros, grades ou qualquer proteção física. Se alguém quiser entrar na nossa casa, não precisa nem pedir licença, porque a nossa varanda com porta de vidro tem acesso à rua. E por causa da nossa amada cachorra, esta porta está sempre aberta. Para se ter idéia, em algumas ocasiões quando o Mauricio esqueceu a chave de casa dentro de casa, ele entrou pela varanda abrindo uma portinhola baixa que dá acesso à rua. Simples assim. Não pulou portão, não escalou muro, não chamou o chaveiro. Por aqui, existe todo um trabalho de conscientização para que a comunidade ajude o trabalho polícia evitando qualquer facilidade para ladrões. Assim, fazemos a nossa parte. Sabe como?, Fechando a porta de vidro a noite. Só isso. Temos mais medo de urso e cocotes do que de assaltante. Uma coisa meio louca ainda para a nossa cabeça brasileira. Mas é importante lembrar que não podemos dar chance para o azar e, pois o índice de violência é próximo de zero, mas não é nulo.


Verde, verde, verde, verde e mais verde. Paisagismo e áreas verdes é o que mais tem por aqui. Não tenho como deixar esta característica de lado, pois é algo que muda o humor de qualquer pessoa. Caminhar entre árvores, gramas e conviver com parques em abundância é algo que faz diferença. No Brasil, eu estava morando próximo ao Parque Ibirapuera e me sentia privilegiada por isso. Mas eu pagava caro por este "luxo". Aqui não precisamos nos esforçar para estar próximos a um parque, pois há por toda parte. E o mais legal de tudo é que eu, pessoalmente, uso e abuso destas áreas. Que seja para levar a Jesse para passear, andar de bike, correr, ler uma revista, escrever no blog, ou apenas para refletir. Não importa a atividade, mas é algo que hoje faz parte da minha rotina ir aos parques. Nem que seja para fazer absolutamente nada, apenas para estar lá. E não pense que vou sempre ao mesmo. Nada disso, são vários à disposição que me dão o prazer de frequentar. Sim, isso faz muita diferença no meu dia a dia. Como eu disse, a diferença está nos detalhes!

Bom, junto a estes itens mencionados, existem tantos outros que me fazem amar este lugar. Mas para mencionar tudo isso, terei que escrever muitos posts ainda! Eu quis apenas mencionar algumas coisinhas que me fazem sorrir naturalmente todos os dias, independentemente dos desafios ou problemas que aparecem. Tenho uma sensação de paz aqui que eu não tinha no Brasil. Não sei se é apenas porque o Canadá me oferece isso, ou se é apenas porque estou mudando como pessoa. O fato é que aqui, a vida me mostra outras perspectivas.








terça-feira, 22 de abril de 2014

- UM ANO que deixei o BRASIL



Depois do processo Skilled Worker mais o tempo de enrolação no Brasil, finalmente havia chegado a hora de imigrar para o Canadá. Maridão veio definitivamente em dezembro de 2012. A minha vez foi em abril de 2013, HÁ EXTATO UM ANO ATRÁS quando eu estava iniciando mais um caminho na minha vida, com novos horizontes.

Lembro-me claramente dos últimos dias no Brasil. O meu medo era muito grande, e junto a isso eu tinha uma sensação de perda. Conforme os dias iam passando e a minha data de embarque se aproximava, parecia que eu estava deixando muita coisa para trás. Tudo aquilo que construí às custas de muita batalha, força, suor, esforço e crença. E não me refiro apenas aos bens materiais. Digo também, e principalmente, das relações construídas com pessoas. Aos poucos eu ia me despedindo dos conhecidos. Alguns nem se davam conta disso, pois muita gente não sabia do meu plano de imigração, sobretudo os de relação profissional. Claro que as pessoas mais próximas estavam a par de tudo e o contato se manteria. Mas ainda assim, eu não sabia como isso tudo seria.

É como se eu estivesse deixando tudo para trás. Eu sentia uma enorme angústia e parecia que até mesmo as coisas mais abstratas e subjetivas também estavam ficando ali, naquele país que me suportou até então. Parecia que eu estava empacotando no meio de tantas caixas todo o conhecimento e experiência que havia adquirido ao longo dos meus 32 anos. Claro que isso não seria descartado, mas certamente ficaria guardado por um tempo, pois grande parte das experiências passadas até este momento eram consequências do que vivi no meu país nativo, e portanto, usadas lá de acordo com o meu dia a dia e minhas necessidades. Agora eu teria que adaptar todo o meu conhecimento e ainda acrescentar muitas novas informações. Eu sabia que teria novos aprendizados, mas o novo assustava muito, aliás, ainda assusta muito.

Fui encerrando os contratos, embalando minhas coisas, finalizando a minha conexão com o Brasil. A cada dia uma tarefa feita, o que significava, uma ligação a menos com o meu país. De repente, aquilo que eu tanto quis e sonhei foi ficando mais próximo. E o medo e a sensação de vazio crescendo. É muito estranho tudo isso, porque é algo que não dá para ficar em cima do muro. Ou vai ou fica. Não tem meio termo. E eu sabia disso, principalmente porque sou o tipo de pessoa que vive nos extremos. Comigo as coisas são no "tudo ou nada", "8 ou 80", "preto ou branco". Sou assim mesmo, radical. Eu gosto das coisas definidas e as odeio pela metade. Pela primeira vez na vida eu quis entrar no "cinza". Eu queria ir e ficar ao mesmo tempo. Eu queria muito o novo, mas queria o velho também. Queria sair da zona de conforto, mas queria tanto ficar nela...

Eu tinha a sensação de que estava deixando a mim mesma para trás, como pessoa. Parecia uma perda de identidade. No nosso caso, não conhecíamos ninguém no Canadá e estávamos indo apenas nós, sem ninguém mais, sem nada, na cara e na coragem, sem lenço nem documento.

Juro que a coragem quase foi embora. Mas aí eu me apeguei a todo fio de esperança possível, respirei fundo e me dei conta de que tudo isso era apenas mais uma tentativa na minha vida. Sem nenhuma obrigação de dar certo e com possibilidade de retorno. 

O engraçado é que quando planejamos mudar de país, ficamos tão focados no que ganharíamos com isso, que não paramos para pensar nas perdas. Claro que tínhamos ciência de que faríamos renúncias, mas não paramos para contá-las. O imigrante sofre muito, sofre pelo que deixa para trás e sofre pelo que passa na frente.

Há um tempo atrás, uma antiga chefe me disse uma vez que "não se pode ter tudo nesta vida". E quer saber? Ela estava certo. E isso é algo que considero muito injusto, pois sempre temos que fazer escolhas, o que necessariamente implica em abrir mão de alguma coisa. E o pior é que grandes decisões significam grandes renúncias. E juro, pensar no afastamento físico da minha família é algo que me corroía por dentro. Que dor difícil de lidar, sobretudo no meu caso que sempre fui muito ligada aos meus pais. Com certeza, o momento mais difícil que já passei.

Enfim, no dia 22 de abril de 2013 deixei o Brasil. Com muita tristeza e muita esperança ao mesmo tempo.

sábado, 12 de abril de 2014

- Copa do Mundo no Brasil




"Não sou muito chegada em escrever sobre assuntos polêmicos aqui no blog, sobretudo porque não quero passar uma impressão ruim para quem lê, caso discorde da minha opinião. Não gostaria que alguém deixasse de acompanhar a nossa história ou pegasse raiva de mim por pensamentos diferentes. Mas considerando que nem todo mundo pensa igual, tem hora que não dá para deixar passar. Tem um assunto que está engasgado na minha garganta há tempos. Como o blog é pessoal, achei melhor escrever aqui o meu pensamento ao invés de sair divulgando idéias soltas por aí com indiretas em rede sociais a fora. Bom, vamos lá..."

Faltam exatamente dois meses para iniciar a Copa do Mundo da Fifa. Na vigésima edição do campeonato de futebol, não tem como negar que a ansiedade tem aumentado ao redor do globo na espera do início dos jogos, que acontecerá no dia 12 de junho deste ano. Não é para esperar por menos, o esporte mais popular do mundo faz bater mais forte o coração de atletas, espectadores, organizadores e todos os profissionais envolvidos na atmosfera do esporte. Sob os holofotes de todo o mundo e dos olhos de milhões de pessoas, o Brasil sediará pela segunda vez a competição.

E apesar da euforia, o campeonato sempre gera reações adversas, e isto é um fato histórico que sempre aconteceu nos países anfitriões. Na vez do Brasil não está sendo diferente. As perspectivas seguem o interesse de cada grupo envolvido no campeonato, sem necessariamente haver o certo ou o errado, mas definitivamente com diferentes intenções. Governo brasileiro buscando crescimento, desenvolvimento e publicidade internacional; espectadores estrangeiros querendo torcer, apreciar os jogos e o turismo; empresas correndo atrás de investimentos diretos ou indiretos; atletas almejando vitória e superação. Cada um procurando alcançar um objetivo específico. A questão contraditória ficou para os cidadãos brasileiros que estão divididos entre diferentes visões. Enquanto uns estão ansiosos pelo primeiro chute na bola, outros não conseguem nem mais lembrar da proposta da Copa do Mundo. Entre a favores e contras, há divergências nas opiniões dos efeitos que o campeonato poderá deixar para o país sede, ou ainda como muitos se preocupam, no que poderá acontecer durante a Copa do Mundo.

No último ano antecedente ao evento, iniciou uma febre de cidadãos brasileiros contra a Copa. Cada um com sua razão. Uns porque se indignaram com os valores gastos na concretização do evento, mesmo que já esperados (incluindo a infeliz corrupção). Alguns por questões sociais, outros por motivos culturais ou econômicos, e as vezes até religiosos. O número de campanhas brasileiras "contra" a Copa espalhadas pela internet é incontável, e mais do que isso, é crescente. Muitos ainda estão trabalhando fortemente na tentativa de sabotar o evento, pedindo ao público estrangeiro que não visitem o país, que não comprem ingressos, que não assistam os jogos, entre outras "ações".  As previsões do número de protestos durante o período dos jogos não são baixas e o governo já tem trabalhado para evitar qualquer tipo de ação do tipo (democracia???). E toda a onda que tomou conta destes cidadãos não são aleatórias, afinal, motivos para todas as indignações não faltam. E ainda soma a questão da falta de infra-estrutura e da violência fora de controle. Tudo junto justifica tanta contrariedade. Eu mesma não sou a favor do campeonato ser realizado no Brasil. Quando o país foi escolhido para sediar os jogos, não comemorei, e sim lamentei. Eu sabia que não haveria a menor condição de proporcionar um evento nestas dimensões. Nós brasileiros sabemos bem como são as coisas relacionadas a "dinheiro x governo". Infelizmente o individualismo fala mais forte e não dá para confiar. Não que o Brasil não tivesse capacidade para fazer a Copa do Mundo, porque isso tem de sobra. Confio nas empresas e profissionais brasileiros, além de saber que há recursos financeiros para bancar tudo o que fosse necessário. É mais a questão de [não] planejamento e corrupção que esgota os cidadãos. Não tem jeito, é um por si e Deus por todos, e nestas horas não é o brasileiro que sai recompensado pelo suor do dia a dia. Na verdade, não sou contra a Copa do Mundo no Brasil, mas sou contra os moldes que isso seria e está sendo.

Aquela história de que há prioridades é verdade. Mas vamos ser sinceros. O Brasil tem dinheiro para a Copa, saúde, educação, segurança e tudo o que um país precisa. É questão de querer fazer. A Copa só prova para os brasileiros aquilo que todos sabem: que somos capazes de empreender e fazer as coisas acontecerem. Eu acredito que a base para qualquer sociedade é a educação, e infelizmente o governo brasileiro não prioriza isso. E o motivo para a falta desta prioridade é simples: povo sem educação é facilmente manipulado. E para o governo, quanto mais "ignorante" for o povo, mais fácil de controlar. É triste demais este pensamento, mas como já disse aqui no blog, a individualidade fala mais alto e os governantes preferem isso à ter um bom país para viver.

Por tudo isso, é compreensível que muitas pessoas queiram aproveitar a oportunidade de um evento desta dimensão para protestar e mostrar ao mundo questões brasileiras, quase como um pedido de ajuda. Mas o problema é que isso não trará nada muito significativo, afinal, questões internas são questões internas, e o "mundo" não se movimentará para resolver problemas nacionais. Saúde, educação, sociedade, economia, entre milhares de outros pontos são e devem ser tratadas internamente. O brasileiro vai ter que resolver todas as questões sozinhos por si só. E neste caso, o "mundo" tem um único objetivo em relação ao evento, que é o esporte e tudo o que ele proporciona. A Copa do Mundo tem seus próprios propósitos e certamente deixará um legado ao país sede. E portanto, apesar disso tudo, existe o outro lado da história.


O evento vai acontecer, independente da vontade dos cidadãos. A decisão foi tomada há anos atrás e os jogos iniciarão em breve. Isso não é uma opção, é um fato. Sabendo-se disso, talvez valerá mais a pena o grupo do "contras" aderir o grupo do "a favores" e juntos trabalharem por um único objetivo, que é fazer com que a Copa do Mundo aconteça como um espetáculo que só o Brasil poderá oferecer na história. Não estou dizendo que as questões negativas do governo (e tudo mais) devem ser deixadas de lado e ignoradas, mas estou me referindo em respeitar o público estrangeiro que tem o direito de aproveitar o campeonato, assim como os próprios brasileiros. É claro que um país menos desenvolvido, como o Brasil, pode sofrer mais que o esperado para organizar o Mundial, mas ainda assim, os jogos vão acontecer e o evento deixará resultados. Apesar de tantas controvérsias, agora não tem mais jeito, por isso é mais válido fazer as coisas acontecerem. 

Eu em particular não me lembro de nenhum questionamento social, político, econômico, whatever, por parte dos brasileiros quando aconteceu a Copa na África do Sul. Eu não me recordo de nenhuma conversa relacionada aos problemas internos daquele país. Por que será? Simples, porque não era do interesse de ninguém. O máximo que se comentava era a respeito da segurança e infra estrutura que seria oferecida ao turista durante o Mundial. E da mesma forma, hoje todos ao redor do globo aguardam os jogos sem se quer se preocupar se há fome, hospitais, corrupção, ou qualquer coisa no Brasil. Não é preocupação do mundo, e sim do brasileiro. Por isso volto a dizer, campanhas contras só farão mal e não trarão nenhum resultado positivo. Quem está na chuva, é para se molhar. 

Hoje, estando de fora da muvuca enxergo tudo de outra forma. Conheço canadenses que irão assistir os jogos no Rio. E sabe o que me perguntam? Eles querem saber qual é a melhor praia, melhor caipirinha, melhor feijoada, onde alugar carro, que horas é melhor visitar o Cristo Redentor, etc. Acima de tudo, eles são turistas. Ponto!

E sabe o que eu faço? Dou as melhores dicas possíveis para que eles façam uma excelente viagem. Quero mais é que eles voltem para cá felizes e satisfeito com as férias merecidas. E ainda peço para torcerem pelo nosso país! Claro! Quero que eles tenham vontade de voltar para o Brasil e conhecer outros lugares além do Rio, que amem esta terrinha (assim como eu), que só falem bem do país. E aí sim, quando ouvirem mais para frente alguma notícia ruim do Brasil, eu espero que eles pensem o quanto o povo brasileiro merece algo melhor. Mas só. Mais do que isso, seria ilusão da minha parte.

Acho engraçado quando alguém "suplica" por atenção externa. Quando o Brasil resolve ajudar outro país, todo brasileiro se indigna e acha um absurdo, pois afinal, acham justo que os impostos pagos sejam investidos no próprio país, e não apenas dinheiro, mas que a atenção política seja para os problemas internos. E eu concordo com isso. Não dá para ajudar os outros quando não consegue ajudar a si próprio. E é por isso que não espero nada dos estrangeiros, pois sei que cada cidadão de fora está correndo atrás de resolver os próprios problemas. Apesar de vivermos em um mundo globalizado, os interesses ainda são independentes. Talvez um dia o mundo pense de forma unificada, mas até lá, não dá para ficar esperando atitude do outros né?! Principalmente de turista.

Agora, aproveitar a oportunidade para mostrar para o governo o quão o povo está insatisfeito, sim, acho isso absolutamente espetacular. Vaiar a presidente? Ótimo! Demonstrar a realidade? Claro que sim! Esclarecer que a política do "pão e circo" já não funciona mais? Certamente!! Eu, como todo brasileiro trabalhador, sei bem como é revoltante não ter o retorno do merecido recurso pago através dos impostos. Não é a toa que hoje sou imigrante. Há razões concretas para isso.

Neste meio tempo, enquanto escrevo estas coisas, tenho certeza de que tem gente pensando que desisti do Brasil e que é fácil falar estando fora. Não, isso não é verdade. Muito pelo contrário. Para começar não desisti do Brasil, desisti de ser "passada para trás" e desrespeitada pelo governo. O país é uma democracia, na qual a maioria vence. A partir do momento que não concordo com a "maioria", simplesmente me vi como um peixe fora d'água. Não me encaixo mais no lugar e ponto. E quanto ao "é fácil falar estando de fora", só quem não é imigrante pode pensar assim. Recomeçar uma vida por questão de princípios e valores não é fácil. Deixar tudo para trás que foi construído, e mais do que isso, abrir mão da convivência com a família é extremamente difícil. Adaptar-se aos novos costumes e regras é algo surreal. Foi uma opção? Sim, e muito bem pensada, mas longe de fácil. Então para aqueles que acham que é "fácil falar" ou que sou fraca por ter "fugido", acredite, as coisas não são assim. Sobretudo porque há milhares de razões que fazem uma pessoa sair do seu país nativo. 

Estar do lado de fora vendo o país afundando, e ainda mais com a minha família por lá, é muito frustrante, preocupante, triste, revoltante, tudo junto e misturado. E o pior, não ver uma luz no fim do túnel simplesmente acaba com qualquer esperança.

Eu sou o tipo de pessoa que fala do Brasil com orgulho, mas de forma realista. Sou clara e sempre digo que "o Brasil é o melhor país do mundo com o pior governo do mundo, e que a somatória dá uma média que fica abaixo da expectativa de qualquer pessoa honesta e trabalhadora". Acrescento que é difícil demais conviver com a desigualdade social, e suas consequências, que é frustrante trabalhar e fazer a sua parte diariamente sem ter nenhum tipo de retorno, ao contrário, de ser apenas "sugado". Que é triste ver as pessoas em um estado de estress (que poderia ser evitado) que acaba resultando na falta de respeito e na individualidade, muitas vezes até por questão de sobrevivência. E o pior de tudo, não ter nenhuma perspectiva de melhora.

Então, depois da mistura de esporte e reflexão, acho que no final as pessoas já não sabem mais do que se trata de fato a competição. Agora não é o momento de lamentar, é hora de torcer pela seleção do coração, e ir mais além, torcer por um evento de sucesso capaz de gerar excelentes resultados e saudáveis frutos ao Brasil e brasileiros. E a nós que vivemos de fora desta arquibancada, resta torcer para que tudo certo! 

Ponto! Falei e desabafei!