Sempre ouvi em noticiários sobre a violência no Brasil, mas tenho que
confessar que em 32 anos morando em terras brasileiras, nunca passei por nenhum
tipo de violência, nem mesmo assalto de celular na rua ou no farol. Por muita
sorte, este é o tipo de experiência que Graças a Deus e por muita luz nunca
vivi.
Por outro lado, ironicamente tive algumas más experiências com a polícia
no Brasil. Em 2000, fui parada duas vezes por policiais enquanto dirigia. Em
ambas, apontaram arma para mim. As situações foram parecidas e eu estava
dirigindo no trânsito de São Paulo normalmente, em horário comercial indo para
a faculdade. Meu carro era um Corsa sedam, novo, prata, simples, típico de
estudante universitário. Não tinha nenhum problema, não estava batido, não
tinha insulfim escuro. Eu não havia infringido nenhuma lei trânsito ou dado
qualquer razão para que me parassem. Nas duas ocasiões, os policiais haviam
parado outros carros e eu "entrei no bolo". Sem fazer absolutamente
nada de errado. Que quisessem que eu parasse o carro, ok, sem problemas, é o
trabalho deles averiguar se as coisas estão certas. Mas apontar arma? Para uma
menina de 19 anos? Em pleno horário comercial? No meio do tráfego intenso de
São Paulo? Gritarem e desrespeitarem a toa? Não! Isso não! Foi algo
completamente traumatizante. Ou seja, problema não foi me pararem, mas sim o
procedimento tomado por eles. Um absurdo.
Além disso, por algumas outras experiências pessoais e histórias de
amigos que também sofreram algo do tipo gratuitamente, acabei perdendo a crença
na polícia brasileira. Não me sentia protegida de maneira nenhuma e sempre
ficava com a pulga atrás da orelha quando estava próxima de algum policial.
Aquela história "quem não deve não teme" literalmente não cabia nestas
situações. Eu temia sem dever nada! No fim das contas, perdi a confiança
naqueles que deveriam me proteger. Sem falar no excesso de autoridade,
corrupção, arrogância, blá, blá, blá...
Também já tive alguns péssimos casos com a equipe da CET (segurança de
trânsito), aliás, acho que com esta todo mundo já teve (rssssss).
Aí chegando aqui no Canadá, a impressão e reação que eu tinha por estes
profissionais continuou. Era só eu ver um policial que eu já ficava rígida,
branca, congelada. Sendo imigrante então, nem se fala.
Até que eu comecei a trabalhar na cafeteria. Por coincidência há uma
delegacia bem na frente, então a presença de policiais por lá é constante.
Lembro que na primeira vez que eles foram lá, estavam em um grupo de 5
pessoas. Eu quis preparar a bebida deles
correndo, perfeitamente, e torci para que fossem embora de lá o quanto antes, pois eu estava
meio tensa. Neste dia, o primeiro policial para o qual servi o café logo me
perguntou "How are you doing today?" (Como você está hoje?). Tentei
ser educada e breve respondendo "I am good, thank you for asking" (Eu
estou bem, obrigada por perguntar). Assim que ele me ouviu falar, logo
reconheceu meu forte sotaque e já perguntou de onde eu era. Mal terminei de
falar Brasil e ele já falou "Hola, cómo estás?" com sotaque espanhol.
Aí continuei a tentar ser educada e perguntei se ele falava espanhol. Com um
enorme sorriso no rosto ele respondeu "Not at all. It is the only thing
that I know. It was my way to say welcome to Canada" (De maneira nenhuma.
É a única coisa que eu sei. Foi a minha maneira de dizer ‘bem vinda ao
Canadá’”)
Não preciso nem mencionar o choque né?! No dia seguinte este mesmo
policial, Tim, voltou com outros colegas para me apresentar, pois como eles vão
para o Brasil para ver a Copa, ele queria que conversassem comigo. Daí em
diante só risada. Até hoje são uma graça comigo. Vivem contado piadas, me
ajudam com o inglês, e tudo mais. Tem um em especial eu
adoro, e chama-se Mike. Sempre está de bom humor e vai todos os dias lá. Semana passada mesmo
ele estava "zoando" comigo. Ele tem aquela mania de dizer que basta
lavar o carro que chove. Como a semana toda foi de sol, na sexta-feira quando
ele foi comprar café pedi um "favor" a ele. Eu pedi que não lavasse o
carro pois eu teria o final de semana livre e portanto queria aproveitar o sol.
Ele entrou na brincadeira e já foi logo falando que não jogaria nenhuma gota de
água no carro pois também pretendia curtir os dias "offs" e não
queria arriscar... Estas bobagens! O fato é eles são um doce! A cada dia que
lido com eles, mais eu os admiro. Como canadenses, clientes, profissionais.
Mas a experiência não fica aí. Calma lá! Eu não sou perfeita e também
faço besteira, ainda mais aqui. O problema é que o policial canadense já percebeu isso (kkkkk).
Brincadeiras a parte, já fui parada pela polícia duas vezes aqui enquanto
dirigia. Coincidência? Não! Em ambas eu tive "culpa no cartório". Eu
estava errada mesmo e me pararam por isso. Então vamos aos "causos".
A minha primeira experiência aconteceu um dia em que eu estava voltando
do trabalho a noite. Eu só vi pelo retrovisor as luzes coloridas piscando do
carro de trás e aquela sirene notável "uol-uol-uol-uol". Encostei o
carro e fiquei esperando o policial me abordar. Já fui logo pegando o documento
e tudo mais. Ele veio até a minha janela, não pediu meus documentos, apenas
perguntou o por quê de eu estar com os faróis do carro apagado durante a noite.
Assustada eu respondi "Euuuuuu???? Luz apagada??????". E não é que
estava mesmo! Respondi que eu não havia percebido e que tinha sido sem querer.
Na verdade, fiquei assustada com a minha própria irresponsabilidade. Pedi um
bilhão de desculpas. Aí ele respondeu sorrindo (juro, sorrindo) "senhora,
porque não usa o comando de faróis automático do carro? Assim não esquece
mais!". E ele estava certo. Na verdade sempre deixo o comando do carro
para acender os faróis automaticamente conforme a luz do dia. Mas uma semana
antes disso, meu amado cunhado veio nos visitar e desligou o tal. Como as ruas
são bem iluminadas, eu acabei nem me dando conta de que os faróis estavam
apagados. No fim das contas até fiz uma brincadeira dizendo que pelo menos o
carro era branco e facilitava que os outros me vissem. Ele riu, me liberou
dizendo para eu ser cuidadosa, voltar para casa em segurança depois do meu dia
de trabalho. Respirei fundo e dei um suspiro de alívio. Nada de multa. Mas foi
justo porque afinal só tive meia culpa. Tenho que admitir que parte do problema
foi o meu cunhado (kkkk).
E a outra história Priscila???? Totalmente minha culpa desta vez. Mas nesta passei
vergonha. Era um dia típico e eu estava indo ao trabalho, suuuuper atrasada.
Nesta hora você deve estar pensando que eu estava correndo. Nada disso! Na
verdade o relógio do carro estava errado já fazia um tempo, mas eu nunca o
arrumava por pura preguiça. Aí eu peguei meu celular para conferir a hora
quando no exato momento um policial estava passando do meu lado de moto. Ele
achou que eu estava mandando mensagem e aí veio novamente as luzes e o "uol-uol-uol-uol" irritante da sirene. Encostei o carro e lá veio o policial. A conversa foi mais ou menos assim:
Policial: Você estava usando o celular?
Priscila: Não.
Policial: Mas eu acabei de ver você
com o seu aparelho!!!
Priscila: Ah! Verdade! Eu estava
conferindo o horário, porque o relógio do carro está errado e eu estou super
atrasada para o trabalho.
Policial: Quem em sã consciência mantém o relógio do
carro errado?
Priscila: Eu! Desculpa, mas todo dia
quando chego em casa estou tão cansada que tenho preguiça de arrumar e deixo
para o dia seguinte. Aí no dia seguinte saio correndo e por falta de tempo
acabo não arrumando, blá blá blá – continuei com minha explicação esfarrapada,
verdadeira, mas esfarrapada.
Aí o policial olhou para o relógio e
viu que eu não estava mentindo, e continuou a fazer perguntas:
Policial: Você me parece familiar. O
que eu sempre peço?
Priscila: Hã??? – eu não havia
entendido o que ele ele queria dizer com a tal pergunta.
Policial: O que eu sempre peço??? –
ele repetiu
Finalmente entendi que ele estava se
referindo à cafeteria e que ele era um cliente. O diálogo continuou:
Priscila: Latte? Americano? Long
Americano? Pike? – respondi com cara de dó e dúvida ao mesmo tempo que tentava advinha o que ele regularmente comprava.
Policial: Não!!!! Você nem ao menos
sabe o que eu peço!
Priscila: Desculpa! Mas é difícil de te reconhecer com o óculos de sol e o capacete. Desculpa!!! De verdade.
Policial: Ok. Você tem idéia de
quanto custa a multa?
Priscila: Não, nenhuma idéia.
Quanto?
Policial: Custa CAD$ BUZILHÃO,00!
Quantos "Shifts" (escala de trabalho) você precisa trabalhar para pagar esta multa?
Priscila: Nossa! Custa isso tudo? - eu fiz as contas e continuei respondendo - Três shifts
completos, no turno da noite, fechando a loja! É muito!!!
Policial: Está vendo como é caro
fazer coisa errada? E blá blá blá - leia isso como um enorme sermão – Desta vez
deixarei passar. Mas que isso não se repita!!!
Priscila: Não nunca mais! Arrumarei
o relógio hoje! Prometo!
Policial: Ok! Agora vá com calma.
Eu já estava do lado da loja, há um
quarteirão de distância. Conclusão, cheguei mais atrasada, com o ouvido doendo
pelo sermão e super envergonhada.
Esta “brincadeira” me custou sermão
todos os dias daquela semana. Todos os dias o mesmo policial foi lá e repetiu a
mesma "bronca". Foi uma semana de vergonha. Confesso que aprendi a lição!
No fim das contas, já tive algumas
experiências com a polícia daqui (rsssss). Nenhuma me deixou trauma, pelo
contrário, me deixou mais segura em relação ao trabalho destes profissionais.
Acredite, tudo tem uma explicação.
Conversando bastante com eles todos os dias e fazendo algumas pesquisas,
entendi este comportamento coerente. Primeiramente, eles tem alto salários por
aqui. Alto mesmo! Além disso, o procedimento e tipo de trabalho é diferente. A
função do policial é manter a ordem e isso significa prevenir. A maior parte do
tempo eles usam para educar e orientar a população, não prender ou resolver casos. Faz parte
da cultura local, os policiais conhecerem a comunidade. E eles se esforçam para isso.
Em geral, sabem o nome das pessoas que vivem na área de atuação, eles conversam
com todos, interagem, são simpáticos e transmitem confiança. Eles fazem parte
da comunidade que trabalham e isso faz toda a diferença. Eles respeitam as
pessoas e as pessoas os respeitam. E eu vejo isso todos os dias. Não é algo que
simplesmente me falaram, mas sou testemunha deste comportamento incrível. Eles
são demais! Não há preconceito. Todos me conhecem e sabem meu nome. Não apenas
porque trabalho próximo a eles. Quando estou andando pelas ruas sem uniforme,
continuam me reconhecendo e conversando comigo. Eles sabem onde moro, que sou
casada, que tenho cachorro, etc. Eles já sabem meu perfil de pessoa e isso
facilita o trabalho deles. Tenho que admitir que é espetacular o trabalho
deles. Assim como toda a infra-estrutura oferecida a estes profissionais. A
delegacia é linda e muito bem equipada. Em geral são grandes prédios, bem
protegidos. Para você entrar lá, é necessário tocar um interfone e o acesso é
controlado. Os veículos e todos os equipamentos usados pelos policiais são de
primeira. É nítido que eles trabalham satisfeitos e gostam do que fazem.
E o que mais me impressionou por
aqui foi a “ausência” de polícia na rua. Na verdade, assim que cheguei no
Canadá eu percebi que não via muitos policiais fazendo ronda ou coisa do tipo.
Mas eu estava completamente enganada. Eles estão por toda parte. É muito comum
eles circularem pelas ruas com carros “a paisana”. Você não percebe que são
policiais pois andam em carros aparentemente comuns. De repente você vê luzes e
sirenes vindo de um veículo normal. Os carros são em sua maioria disfarçados.
Só dá para perceber que são policiais se você parar para observar bem a dupla
dentro do veículo e ver que estão de farda. Mas quem fica na rua olhando dentro
de todos os carros??? Impossível! E não existe um padrão de automóvel para
estes carros disfarçados. Tem de todos os tipos, grande, pequeno, caminhonete,
van, sedam, etc. Então, antes de pensar em fazer qualquer coisa errada,
acredite, tem um policial por perto e você nem imagina onde.
Não parou para o pedestre? - uol-uol-uol-uol – sirene na certa!
Passou no farol vermelho ou não parou no amarelo? - uol-uol-uol-uol –
sirene na certa!
Andou acima da velocidade? - uol-uol-uol-uol – sirene na certa!
Furto? - uol-uol-uol-uol
– sirene na certa!
Vandalismo? - uol-uol-uol-uol – sirene na certa!
Não importa, qualquer coisa errada
que seja feita, eles pegam!
Então, não tem jeito. O negócio é
seguir as regras mesmo! E mesmo que eles não estejam lá, não é bom viver em um
lugar organizado e seguro? Então, seguimos as regras e isso significa se encaixar na nova cultura. Mas tudo bem, se
quiser errar, vai se pego! Eu sugiro fazer as coisas certas ;)
É tão exorbitante a diferença com o Brasil que não tem nem explicação.
ResponderExcluirÓtimo post Pri :)
Bjos
Karol,
ExcluirA diferença é enorme mesmo, e achei válido dividir isso porque é algo que me chocou e por coincidência ou não, convivo muito com estes profissionais atualmente. Você ainda vai ver isso :)
Beijos
Pri
se no Brasil te pararam eles não tem bola de cristal para saber se tu tava drogada e etc..aqui eles param e ta rolando paquera!!! ENJOY IT. HAHA
ResponderExcluircomparar policia eh ruim hein? va para Bulgaria e fala de la..
O trabalho deles é muito bom! Claro que a ausência de desigualdade social forte os ajuda, mas ainda assim, o comportamento deles é digno da profissão. Não há perfeição, como em tudo, mas acho que é algo a se destacar :) Lamento pelos profissionais brasileiros não terem o tratamento e a oportunidade igual. Mas quem sabe um dia!
ExcluirUm abraço
Priscila
Olá Priscila, amei conhecer o seu blog. Eu curso Arquitetura e Urbanismo, mas algo me chamou a atenção para deixar um comentário aqui. Meu marido é fluente em inglês e é policial aqui no Brasil, Rio de Janeiro. Como você disse que sempre tem contato com policiais, saberia me dizer se o meu marido teria chance de conseguir trabalhar aí como policial, pois ele conheceu um rapaz que era policial aqui e que hoje é policial no Canadá. Aguardo contato, abs.
ResponderExcluirOlá Ana Paula
ExcluirObrigada pelo comentário.
Existe chance do seu marido se tornar policial aqui sim, e com muita dignidade em volta. A única questão é que precisa ser cidadão canadense para tentar a carreira. A cidadania pode ser conseguida depois de quatro anos morando aqui através de um processo específico. Mas para ser sincera, acho que vale a pena a espera. Se eu tivesse perfil para ser policial, certamente tentaria a carreira.
Boa sorte para vocês!
Priscila
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
ExcluirPriscila
ExcluirGostei muito da sua história com a polícia canadense, já tinha pesquisado sobre ela e quase sempre achei boas notícias, inclusive vi a história do policial do RJ que virou policial canadense e está muito feliz atualmente, queria saber se você pode me tirar algumas dúvidas: Os policiais com que você convive são de que cidade no Canadá? Você sabe como funciona a parte investigativa da polícia canadense?Eles realmente investigam?Caso você tenha que relatar uma ocorrência em uma Delegacia local como é o atendimento?Eles apenas fazem um BO ou realmente se preocupam em investigar os casos (ex.: Furto ou Roubo de Veículo, desaparecimento de pessoas)?Eu sei que são várias perguntas, mas tenho pensado seriamente em mudar de país e me tornar policial, mas não quero me iludir com as polícias de outros países...Obrigado pelo que você puder responder.
Olá!!!
ExcluirNão consigo lhe dar muitas informações precisas a respeito pois minha experiência com a polícia é bem pequena (ainda bem!). Mas de qualquer maneira, para qualquer coisa que aconteça que seja necessária a participação da polícia, será feito um documento tipo BO. Dependendo do caso, haverá investigação com certeza. Nós não temos conhecimento do andamento dos processos pois é algo sigiloso. Mas ouvimos em noticiários ocorrências já resolvidas e declarações da polícia. Mas lembre-se que casos como furto e roubo são raros por aqui. Não que não aconteçam, mas não é algo rotineiro igual ao Brasil pois o trabalho é de prevenção e a comunidade trabalha junto para isso. Os policiais que convivo são de New Westminster e pessoas bem legais. A carreira da polícia aqui é bem interessante, mas tem que ter o perfil. Além disso, não é algo que você consiga assim que chegar imigrar, pois tem que ter um mínimo de residência (acho que pelo menos quatro anos). Espero ter ajudado um pouco!
Abraço
Priscila